gotas d’água agarradas em arames preguiçosos pregadores de madeira que abraçam esses mesmos arames preguiçosos eles são rijos, mas enferrujados e ainda há os pregadores coloridos de plástico e ainda consigo ouvir daqui as vozes expurgadas de um igreja local e chove, e chove, e as gotas caem gotículas cristalizadas que caem ao chão integram-se ao vazio para evaporar-se, quem sabe, amanhã e as folhas verdes carcomidas sustentadas por gravetos tortos e o barro e a bosta amanhecida de meu cão que limpam a sola de minhas botas rotas e chove, e chove, e há gotas e mais gotas gotas para insanos que sentem prazer em se molhar decido pintar essa cena, mas eu não pinto bem. leva-se dias e semanas e meses para findar algo de valor. leva-se vidas e muitas desgraças para expressar o belo vestido frio e cinzento de um casamento. e as padarias já estão fechadas, bato no portão: — quem é? fechamos. — um cliente. quero comprar cigarros. eles preferem ficar dentro, estão certos. sempre certos, acostumaram-se com o doce gosto da convicção. e organizam cédulas, e mexem nos pães, e limpam a pia, e arrumam o balcão, e lavam a louça, e varrem o chão, e conversam entre si, reclamando do horário, reclamando do whatsapp ter ficado fora do ar, falando sobre alguma hedionda atualidade ou entretendo-se com belezas superficiais momentâneas. estão loucos para irem embora, loucos para estarem dentro de suas casas. eles não saem, e nós nunca saímos. vou acender uma lâmpada amarela em meu quintal rezo para que a noite fique mais caótica e meu cão mordisca pedaços de pizza farei desta um dia uma resenha mas, hoje… hoje, não.